quarta-feira, 25 de julho de 2012

São Paulo: capital do grafite


São Paulo: capital do grafite


Nos anos 1980, alguns artistas começaram a usar o espaço público para democratizar a arte, e os muros da cidade foram se enchendo de belos grafismos e desenhos. Hoje não é exagero dizer que a capital paulista nos reserva uma surpresa a cada esquina. E o melhor: os fãs dessa estética já encontram também produtos para a casa

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Lucila Vigneron Villaça
Casa Claudia - 06/2012

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Beco do Batman: uma ruazinha sinuosa, que já foi bastante degradada, atualmente exibe desenhos que são renovados constantemente


NO FIM DA DITADURA, O GRAFITE FOI UM GRITO DE LIBERDADE 

Não se espante se você sair pelas ruas de São Paulo num domingo e se deparar com algum grafiteiro pintando muros e paredes dos bairros. Esse é o dia da semana em que a maioria deles escolhe para fazer o que mais gosta: ficar ao ar livre, imprimindo desenhos em espaços públicos. "Eu faço arte para ser feliz, e o que mais me atrai no grafite é a capacidade de criar diálogos com a cidade", conta o grafiteiro Rui Amaral, um dos precursores dessa arte urbana. Sua geração ocupou as ruas com desenhos no início da década de 1980, quando o país ainda amargava a ditadura. "A repressão política fez com que as pessoas se fechassem nas casas. Tomar a rua era um jeito de quebrar o paradigma repressivo", diz o artista Jaime Prades, ex-integrante do grupo Tupinãodá, que ganhou fama nos muros da Vila Madalena no final dos anos 1980.

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Criações de vários artistas enfeitam os muros imensos que margeiam a Radial Leste. Em destaque, desenho de Nina Pandolfo




ARTE DE RUA ESTÁ LÁ PARA QUEM QUISER VER 

Esse bairro da Zona Oeste, aliás, concentra até hoje grafites variados. Basta passar por lá para apreciar os desenhos. A proximidade faz com que o grafite ganhe a simpatia da população, já que as obras das galerias ainda são vistas como algo inacessível. "Com a arte de rua, todo mundo pode entrar em contato", afirma o grafiteiro Thiago Toes, que desde 2009 enveredou também para as telas, incentivado por Nina Pandolfo - criadora das meninas de olhos grandes que estampam muitos muros de São Paulo e mulher de Otávio, da dupla osgemeos. Os irmãos, hoje famosos internacionalmente, foram os principais responsáveis pela projeção do grafite na década de 1990, quando surgiram convites para que mostrassem seu trabalho em diferentes países.

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A região do Brás, no centro cidade, é povoada pelos gatos da artista conhecida por Minhau. Divertidos e cheios de cor, os desenhos alegram ruas e viadutos cinzentos



AS MULHERES TAMBÉM INVADIRAM OS MUROS 

"A globalização foi determinante para a explosão da arte de rua: com a internet, os artistas puderam se atualizar e trocar informações com o mundo. Além disso, a arte ficou ainda mais disponível para o público, o que fez cair a resistência e o preconceito", conta Baixo Ribeiro, dono da Galeria Choque Cultural, que representa diversos artistas do meio. O acesso mais democrático deu chance também às mulheres. Entre elas, está a paulista Minhau, 35 anos. O codinome nasceu dos desenhos de gatos grandes e coloridos, que são sua marca registrada. Estampados na região central, eles encantam quem passa. "Arrancar sorrisos de crianças e idosos na rua é uma experiência viciante. Graças ao grafite, eu me relaciono com pessoas de todos os níveis sociais", diz.

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O painel na av. Henrique Schaumann, em Pinheiro, reproduz cena da São Paulo antiga. Quem assina é o grafiteiro Kobra



DEMOCRATIZAÇÃO DA ARTE TRANSFORMA VIDAS 

"O grafite ajuda também a elevar a autoestima das pessoas", diz o artista conhecido por Birigui, que cresceu na Vila Madalena e ainda criança se sentiu atraído pelos desenhos nos muros. O envolvimento foi natural e acabou transformando o grafite em modo de vida, com a pintura de painéis e portas de aço sob encomenda. E a convivência com artistas de rua e do hip-hop o fez perceber que a arte poderia servir como um meio de inclusão das populações mais carentes "Virei professor numa ONG há dez anos e, desde então, percebi como as pessoas se sentem valorizadas ao entrar em contato com a arte. Gosto de ver como vão construindo seu aprendizado e se desenvolvendo. Isso só é possível porque o grafite é acessível, democrático", diz.

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O túnel de acesso à av. Paulista foi grafitado pela primeira vez em 1987 - e três vezes apagado. Desde 2001, renova-se periodicamente



HÁ UM ANO, O GRAFITE DEIXOU DE SER CRIME 

O assunto gera polêmica: o grafite e a pichação em edifícios públicos eram considerados crimes ambientais e de vandalismo pela legislação brasileira. Em maio do ano passado, somente o grafite foi descriminalizado. Afinal, pichar e grafitar é a mesma coisa? "As pichações, que são rabiscos e letras feitos para demarcar território ou ir contra as instituições, têm seu valor antropológico. Já o grafite é uma forma de arte e envolve conceito e pesquisa", explica Baixo Ribeiro. "Os dois têm a mesma essência: são meios de protesto ou de diversão, na falta de opções de lazer", diz Rui Amaral, que assina o emblemático túnel da avenida Paulista. Aos 51 anos, ele continua ativo: "Não gosto de ficar pintando telas no ateliê. Meu grande barato é mesmo a rua".

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"Prefiro trabalhos grandes ao ar livre. Faço muitos murais sob encomenda", conta Rui Amaral, que está finalizando este pássaro num condomínio da r. Francisco Leitão, em Pinheiros, a convite da família que administra o imóve
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